Beatriz Paz é Psicanalista, mestre em teoria Psicanalítica pelo Programa de pós-graduação em teoria psicanalítica - UFRJ. Atua na clínica particular e como psicóloga da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro (SME/RJ) no NIAP/PROINAPE (Programa Interdisciplinar de Apoio as escolas), atuando em equipes interdisciplinares com enfoque na criação de espaços de escuta aos estudantes e na promoção do protagonismo estudantil na instituição educacional em nível micro e macropolítico.
Andreia Morais é mestre em Ensino de Artes Cênicas pela UNIRIO. Professora de Teatro da Rede Municipal do Rio de Janeiro, onde atua no NIAP/PROINAPE (Programa Interdisciplinar de Apoio as escolas). Em 2019/2020 foi bolsista do Programa de Bolsas da SME. Em 2023 participou do livro: "Arte na linha de frente” com artigos escritos por professoras/es egressas/os do programa em parceria com docentes do PPGEAC.
A partir de um episódio em que falas de intolerância aparecem no discurso de alguns estudantes, a comunidade escolar entre em alerta. Os episódios que ganharam notoriedade em que estudantes dirigem atos de violência no/ao espaço escolar vêm imediatamente no imaginário dos profissionais, gerando preocupação e, ainda, a aposta na abertura de espaços de diálogo como estratégia de enfrentamento e elaboração de possíveis conflitos. A escola aposta no diálogo e então solicita a equipe do Proinape o apoio para trabalhar com os alunos a relação entre os mesmos, bem como identificar como estes têm se relacionado com o espaço escolar.
A equipe propõe como estratégia 3 mapeamentos a partir de oficinas que promovam espaço aberto de diálogo entre e com os estudantes buscando contribuir para que os mesmos reflitam sobre 3 principais questões:
- Quem sou eu?
- Quem sou eu nas minhas relações na escola/turma e fora dela?
- Quem sou eu na minha escola?
3. Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-cultural.
4. Utilizar diferentes linguagens - verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital -, bem como conhecimentos das linguagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo.
6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.
8. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e emocional, compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas.
9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza.
10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.
A escola tem por fundamento o exercício de aprendizagem na coletividade. Foi nesta perspectiva que a equipe gestora solicitou a equipe do Proinape na tentativa de analisar e propor uma ação em parceria diante de um evento que poderia ter sido conduzido de maneira excludente e individualizante, mas que pôde ser atravessado de maneira coletiva e acolhedora.
Não abordamos o episódio de intolerância de maneira direta, mas identificamos, junto aos alunos, a relação que estes têm entre si buscando a identificação e/ou criação de círculos de confiança entre eles. Apostamos, junto à escola, na oferta de estratégias de escuta/diálogo como forma de enfrentamento de conflitos.
Utilizamos as linguagens artísticas como via de expressão nas relações. 3 mapeamentos foram desenvolvidos usando como recursos desenho, colagem, fotografia e jogos como forma de identificação e elaboração.
Oficina 1: Identidade - Quem sou eu? Quais são as particularidades que me fazem único? Oferecemos ao grupo uma série de imagens para que pensassem qual delas substituiria sua foto na carteira de identidade. Qual foto melhor os representa? Por quê? O que ela diz de você? O objetivo foi acolher a individualidade de cada um, possibilitando a troca entre todos.
Oficina 2: Quiz - Quem sou eu nas minhas relações na escola/turma? O que eu partilho com o outro e o que me é íntimo e particular? Utilizamos como mediador cards com perguntas sobre família, escola e relações. Nosso intuito era o da troca entre eles e a aproximação entre os alunos.
Oficina 3: O foco de mapeamento é a turma como um todo. Lançamos a pergunta: o que faz corpo nesta turma? De quais partes, quais ideologias? Será que as singularidades aqui presentes, fazem unidade? Propusemos aos estudantes a construção de um corpo coletivo da turma. A expressão de cada parte deste corpo construído coletivamente através de desenho e colagem tinha por intenção representar um corpo que falasse de cada um e do grupo, formando uma singularidade coletiva.
Considerando que nossas práticas contemplam uma direção ética onde os sujeitos envolvidos são alvo, mas também atores de cada ação, destacamos que os efeitos do trabalho podem ser narrados de 2 formas:
1- Sob o olhar da equipe gestora e demais profissionais da escola: os professores observaram que a turma trabalhada tem se mostrado mais unida e cooperativa em sala de aula.
2- Sob o olhar dos estudantes: eles elogiaram os encontros com a equipe do PROINAPE em conselho de classe, o que poderia ser lido como o principal resultado. No entanto, o resultado que mais valorizamos foi vivenciado na 2ª oficina com esta turma, onde os alunos, em roda de conversa, afirmaram que se sentiriam mais à vontade conversando entre si, nos indicando que gostariam de experimentar um espaço de autonomia na troca entre eles, sem a mediação de um adulto. Acatamos o pedido (permanecendo do lado de fora da sala) e os alunos trocaram sobre si tocando em assuntos da intimidade de cada um com respeito e leveza.
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