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Peça de mármore com  o símbolo das armas portuguesas, assentada por Estácio de Sá em 1565 (Crédito: Halleypo/Wikimedia Commons)

Os ataques promovidos pelo terceiro governador-geral, Mem de Sá (1500-1572), inutilizando a Fortaleza de Coligny, não expulsaram definitivamente os franceses, fundadores da França Antártica, das terras do entorno da Baía de Guanabara. Grupos de franceses que sobreviveram às batalhas travadas contra as tropas portuguesas escaparam para as matas próximas. Sem desistir e contando com o auxílio dos índios aliados (tamoios), voltaram a frequentar a região após o retorno de Mem de Sá para a sede do governo-geral, em Salvador.

Caravelas cruzaram o Mar Oceano levando correspondências, narrando os fatos e fazendo novos apelos de auxílio, como os encaminhados pelo sacerdote Manuel da Nóbrega (1517-1570). As cartas que alcançaram Lisboa com preciosas informações – algumas com “toques paradisíacos”, segundo o geógrafo João Lima Sant'Anna – insistiam nos riscos e nos perigos que não desapareceram e da necessidade de socorro urgente. O jesuíta alertava que o conseguido pelo governador-geral poderia não ter duração: “Esses franceses permanecem entre os índios e esperam socorro da França, sobretudo aqueles que pretendem estar aqui, a pedido do rei da França, para descobrir metais preciosos que existem neste país”.

O governo português acolheu os apelos de Manuel da Nóbrega. Compreendendo a gravidade da situação, descrita também em outras correspondências, enviou uma frota com reforços para Mem de Sá (1500-1572). À frente da expedição estava o sobrinho do governador-geral – o capitão-mor Estácio de Sá (1520-1567). As lutas foram retomadas. Em 1º de março de 1565, Estácio, reunindo todos os reforços com os quais podia contar naquele momento, desembarcou cautelosamente em uma pequena faixa de terra na várzea ou terra baixa e chã (entre os morros Cara de Cão e Pão de Açúcar), localizada estrategicamente na entrada da Baía de Guanabara. O lugar era um ponto de articulação, na costa atlântica, com as rotas das especiarias e com as feitorias das áreas sob a dominação portuguesa na África e na Ásia. A geografia do lugar permitia um melhor posicionamento defensivo contra os invasores.

Na presença de representantes da Igreja de Roma – Manuel da Nóbrega e José de Anchieta –, Estácio fundou a cidade, instalada sob a invocação de São Sebastião, padroeiro do rei de Portugal, D. Sebastião. “Levantemos essa Cidade que ficará por memória do nosso heroísmo, e de exemplo de valor às vindouras gerações, para ser a Rainha das Províncias e o Empório das riquezas do mundo” (Proclamação de Estácio de Sá – 1º de março de 1565). Naquele sítio provisório, amparado por alvarás, cartas e provisões, assentou a cidade, em meio à disputa com os franceses pela posse da terra. A cidade de inspiração portuguesa e católica foi fundada sobre um pilar: a necessidade de exteriorizar o domínio de Portugal contra as ações dos estrangeiros e dos índios. Era a segunda nas terras da América portuguesa, depois de Salvador, sendo Estácio de Sá seu primeiro governador.

Ao contrário do esperado, a recuperação dessa porção do território – parte da capitania de São Vicente – coube à Coroa portuguesa e não ao seu donatário. Talvez a ausência de recursos financeiros e humanos para uma empreitada de tal envergadura tenha impedido uma ação mais efetiva por parte do responsável pela segurança da região. Segundo o professor Maurício de Almeida Abreu, nos séculos XVI e XVII, singularmente, o Rio de Janeiro caminhou “como uma cidade real, em que o donatário não tem ingerência, em que os governadores são determinados pela Coroa. Aos poucos, nessa condição, ela passou a ser utilizada também como base da administração direta colonial, com a repartição, ainda no século XVI, do governo colonial em dois, o do Norte, sob o comando de Salvador, e o do Sul, de forma efêmera e temporária exercido pelo Rio de Janeiro”.