Em 22 de janeiro de 1917, o primeiro desenho animado criado por um brasileiro foi exibido no Cine Pathé, na Cinelândia. O Kaiser é um curta que satiriza a pretensão da Alemanha de dominar o mundo na Segunda Guerra. O cartunista Álvaro Martins (1891-1949), ou melhor, Seth, como era mais conhecido, acrescentou o movimento ao seu exímio traço e fez o imperador Guilherme II contracenar com um globo terrestre.
Dessa primeira experiência só restou um único fotograma. Mas, em 2013, o diretor Eduardo Calvet convidou oito animadores para recriar o curta, cada um usando uma técnica diferente (2D, papel sulfite, massinha, pixilation e light painting, entre outras), e fizeram Luz, Anima, Ação, que homenageia Seth e a animação brasileira. O mais antigo filme do gênero com cópia preservada é Macaco Feio, Macaco Bonito, de 1928, do animador João Stamato.
Em 1953, surgiu o primeiro longa-metragem de animação – Sinfonia Amazônica, de Anélio Latini Filho, que fez sozinho os 500 mil desenhos da produção. A cor chegou em 1972, com Piconzé, de Ypê Nakashima. O século XXI trouxe a tecnologia digital e, com ela, os criadores foram estimulados a usar a técnica 3D.
25 anos do maior festival de animação da América Latina
Um evento fundamental para a área em nosso país é o Anima Mundi. O festival surgiu como incentivo a produções brasileiras e dando oportunidade a que profissionais e fãs conhecessem diferentes técnicas. O evento foi além da proposta inicial e também forma novos animadores e educadores por meio de iniciativas como o Anima Escola, que capacita professores da rede pública e privada de ensino. Em 2017, o Anima Mundi, que acontece, em julho, no Rio e em São Paulo, traz uma mostra chamada Tesouros do Centenário, com a exibição de filmes que registram o que de melhor já foi feito até aqui.
O financiamento do setor e o acesso a materiais adequados são as grandes questões para quem trabalha na área. Na primeira década dos anos 2000, esses nós estavam sendo desatados com os editais do Ministério da Cultura voltados para o audiovisual e também com a lei que obriga as TVs a exibirem conteúdo nacional. Em grande medida graças a essas políticas públicas, atualmente as crianças brasileiras assistem a 40 séries de animação produzidas em seu próprio país, como Peixonauta, Meu Amigãozão e Show da Luna, que também são exportados para dezenas de países.
O rico folclore brasileiro
A MultiRio apostou na animação para conquistar alunos e professores, levando, desde a sua criação, informação de qualidade à sociedade em geral. Produtos como O Curupira e O Boto, da série Juro Que Vi, venceram o Anima Mundi em 2004 e 2006, respectivamente. Já Matinta Perera foi agraciado com um prêmio da Japan Foundation em 2007. Francisco Tadeu Soares, diretor de animação da MultiRio, diz que trabalhar com desenho e movimento é o que sempre o fascinou. O responsável pelo departamento de Artes Gráficas e Animação, Marcelo Salerno, destaca a importância do espaço para o mercado autoral, como incentivo ao aspecto artístico da animação. De acordo com Eduardo Duval, que também ilustra e dirige desenhos animados na empresa, o que o atrai no ofício é o papel em branco, a partir do qual se pode comunicar uma infinidade de possibilidades.
Hoje em dia, profissionais brasileiros são reconhecidos e valorizados internacionalmente. Muitos deles trabalham em grandes estúdios. É o caso de Carlos Saldanha, diretor das séries Rio e A Era do Gelo, da Blue Sky; Fábio Lignini, animador sênior da DreamWorks, que participou de Como Treinar Seu Dragão e O Gato de Botas; Ennio Torresan, que fez storyboard em Madagascar, Kung Fu Panda e Megamente; Renato dos Anjos, supervisor em Zootopia e Detona Ralph, na Disney; Rosana Urbes, animadora em Mulan; e Leo Matsuda, que participou de Big Hero, esses dois últimos também na Disney.
Annecy, o principal festival dedicado à animação no mundo, que acontece na cidade francesa de mesmo nome, selecionou dois longas-metragens brasileiros como vencedores por dois anos consecutivos, em 2013 e 2014 – Uma História de Amor e Fúria, de Luiz Bolognesi, e O Menino e o Mundo, de Alê Abreu. Só para lembrar: este último foi indicado ao Oscar de melhor animação em 2016.