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Como a escola pode combater o mundo das fake news
25 Julho 2019 | Por Márcia Pimentel
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Matrix
Em Matrix, as pessoas são controladas por um sistema de inteligência artificial. Warnerbros, divulgação

No filme Matrix, o programador Thomas Anderson descobre que vive em um mundo fake controlado por um sistema inteligente e artificial que cria a ilusão de um mundo real, manipulando a mente das pessoas. Vinte anos depois do lançamento do filme, em 1999, o que parecia ficção está se tornando realidade. É isso o que dizem vários pesquisadores e especialistas, diante das incontáveis fake news e imagens manipuladas que têm sido, diariamente, lançadas na internet, a fim de alterar a realidade dos fatos, com a intenção de influenciar a percepção das pessoas sobre o mundo em que vivem.

Segundo o pesquisador brasileiro Edson Prestes, especialista em inteligência artificial e integrante do Painel de Alto Nível sobre Cooperação Digital da Organização das Nações Unidas (ONU), por trás desse cenário estão os grupos de interesses políticos e econômicos, que chegam a contratar robôs para disseminar mentiras em grande escala. Afinal, como já dizia Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Adolf Hitler, “uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”.

Em artigo recentemente publicado na Revista IHU Online, da Unisinos, Michel K. Spencer, editor do site FutureSin, especializado em inteligência artificial e afins, escreveu que as tecnologias deep fake, em pleno desenvolvimento, aumentam ainda mais o potencial das fake news. Uma dessas tecnologias é a GPT-2, da OpenAI, que está se tornando conhecida por sua capacidade de fazer robôs escreverem mimetizando estilos – que podem ser o de uma celebridade, o de um político, ou simplesmente o seu.

Outra deep fake é a Generative Adversarial Network (GAN), que constrói rostos artificiais de alta qualidade, com um realismo tal que torna difícil dizer que não se trata de uma “pessoa” humana, de existência real. Essa mesma tecnologia também é capaz de combinar vídeos existentes, transformando-os em um novo vídeo falso, que mostra alguém realizando e falando coisas que nunca fez e disse na realidade. Há até quem já vislumbre a criação de “jornalistas” fakes, produzidos por inteligência artificial, ancorando notícias para o bem e para o mal.

Novos desafios para a Educação

Se, há cerca de 10 anos, o grande paradigma da internet era o de sua universalização, hoje, a palavra de ordem é capacitar crianças, jovens e adultos para atuarem na web, conscientes dos riscos do mundo online, tanto no que diz respeito à vulnerabilidade da privacidade, como à manipulação da informação para fins políticos e econômicos. Quem diz isso é Edson Prestes, o pesquisador brasileiro do Painel de Alto Nível sobre Cooperação Digital das Nações Unidas.

Em entrevista recente para o Centro de Informação da ONU no Brasil, ele afirma que as escolas precisam capacitar para a reflexão crítica. Segundo ele, já não basta saber como usar a tecnologia. É preciso, sobretudo, ensinar o aluno a perceber quando está sendo manipulado e por quais motivos querem manipulá-lo.

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Pesquisadores de universidades europeias analisaram 1004 vídeos na internet e encontraram inúmeros frames com expressões faciais editadas. Arxiv.org

Para a professora Rosália Duarte, da Pós-Graduação em Educação da PUC-Rio, que pesquisa linguagens digitais, a escola também precisa mudar o seu viés conteudista: “Os educadores têm que romper com a lógica do século XX. A mera reprodução de conteúdos não produz mais as habilidades necessárias ao cidadão do século XXI. Urge uma nova escola, aquela que desenvolve a capacidade de pensar”. E isso, diz ela, não é tarefa de um só professor. É preciso que a escola tenha um projeto que abrace os novos desafios do tempo atual.

Como ensinar a pensar

Para a professora Rosália Duarte, é preciso discutir com os alunos a natureza da verdade. Passar informações falsas para alterar a percepção das pessoas sobre o mundo em que se vive é, segundo ela, má fé e falsidade ideológica. Mas as interpretações sobre a informação correta podem ser diversas e ter várias verdades. E para entender cada uma delas é fundamental discutir o contexto, as bases sobre as quais cada uma se assenta e quais narrativas as sustentam (religiosa, econômica, histórica?).

“Essa discussão precisa ser permanente no ambiente de ensino. Não se pode mais lançar um conteúdo sem contextualizá-lo. Quando se apresenta uma questão nova em sala de aula, é fundamental mostrar quem a escreveu, a partir de quê, quais passos deu para chegar àquela conclusão”, defende Rosália, para quem a principal tarefa da escola do século XXI é ensinar o aluno a pensar.

Muito embora, diante do avanço da manipulação da informação, esta seja uma necessidade urgente do tempo em que vivemos, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) constatou que ensinar a pensar é uma tarefa que não vem sendo cumprida pela maior parte das escolas do mundo, à exceção de alguns poucos países como a Coreia do Sul, a Noruega, a Finlândia e a Suécia.

Como checar as notícias

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Imagem: rawpixel

Em entrevista ao Instituto Net Claro Embratel, o professor de Comunicação Ricardo Alexino Ferreira, da USP, defendeu a tese de que o projeto pedagógico interdisciplinar é a melhor forma de ensinar o aluno a compreender os contextos. Para ele, atividades pontuais não ajudam muito a construir estudantes mais reflexivos.

A agência de checagem de notícias Aos fatos parece concordar com essa premissa. Segundo o editor Bernardo Moura, a verificação de informações enganosas não é um mero processo jornalístico, mas sobretudo interdisciplinar: “Envolve o uso de habilidades como interpretação de textos, análise de cálculos e de estatísticas, conhecimento de fatos históricos, geográficos e de indicadores sociais e econômicos importantes”. Por isso, se concilia tão bem com os processos educacionais e ambientes de aprendizagem, na visão dele.

Ainda que as ferramentas de deep fake estejam se tornando cada vez mais sofisticadas, a maioria dos conteúdos falsos viralizados nas redes ainda tem produção rudimentar. “São fotos verdadeiras tiradas de contexto, vídeos editados e que não retratam o que informam suas legendas e manchetes, textos toscamente editados ou mesmo rumores jogados em posts, e que, muitas vezes, nem podem ser verificáveis com base em informações. Geralmente, o sucesso de uma peça de desinformação vincula-se ao quanto ela confirma visões de mundo de uma determinada audiência”, conta o editor Bernardo Moura.

Passos da checagem

A agência Aos fatos enviou o passo a passo básico da checagem da informação. Veja quais são:

- Verificação da origem do conteúdo: quem postou? Quais as características do perfil, site, ou pessoa que compartilhou a notícia?

- Observação do conteúdo: a data de publicação indica ser algo antigo? O veículo que publicou tem credibilidade reconhecida? Há fontes confiáveis no material? A informação pode ser encontrada em outras fontes confiáveis?

- Outras pistas: procurar em buscadores, como o Google, se agências de checagem já verificaram o conteúdo, se a notícia repercutiu em outros meios, ou se foi desmentida por pessoa ou entidade de reputação confiável.

- Verificação da origem da imagem: é possível fazer, pelo Google, busca reversa que indica a origem da foto. No caso de vídeos, há ferramentas, que fazem a pesquisa no YouTube, como a InVid.

No ano passado, a Aos fatos produziu uma história em quadrinhos com um passo a passo da checagem da informação. Também publicou um plano de aula feito por checadores de notícias italianos. Embora tenha sido elaborado para alunos do Ensino Médio, o material pode inspirar atividades para o Ensino Fundamental.

A MultiRio também disponibiliza o jogo online Caô Digital, para alunos do 6º ao 9º ano. O game educativo dá dicas de como identificar boatos e notícias falsas na internet. Para jogá-lo, clique aqui.

 
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