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Ciranda: história e origens
02 Julho 2021 | Por Fernanda Fernandes
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O estado de Pernambuco é conhecido como o berço da ciranda no Brasil (Foto: Passarinho/Pref. Olinda)

A ciranda é parte da cultura popular brasileira. Está presente na Educação Infantil, na tradição indígena, em manifestações políticas e movimentos sociais.

Como dança, é muito tradicional no Nordeste brasileiro, principalmente nos estados da Paraíba e de Pernambuco. Neste, é destaque na Ilha de Itamaracá, onde se diz que foi inspirada nos movimentos das ondas do mar.

A origem da ciranda, no entanto, não é consenso entre os pesquisadores. Acredita-se que tenha surgido em Portugal. O nome teria vindo do espanhol “zaranda”, um instrumento usado para peneirar farinha.

Danças de roda estão presentes em diferentes países e são marca da cultura popular de diversos estados brasileiros. Em cada local, possuem especificidades, características, conotações e sentidos particulares.

O início da ciranda no Brasil

Os primeiros estudos sobre a ciranda no Brasil foram realizados por volta dos anos 1960. Eles apontam que o marco inicial no país teria ocorrido por volta do século XVIII, sobretudo na região Nordeste.

Segundo Jaime Diniz, padre, musicólogo e pioneiro na pesquisa sobre a ciranda em Pernambuco, o predomínio se deu na Mata Norte e no litoral desse estado.

A composição era uma interação entre o canto e a dança. Os temas das letras não eram fixos. Em geral, versavam sobre a agricultura, o campo, a natureza, o amor, as praias etc.

Inicialmente, as cirandas eram praticadas por trabalhadores rurais, pescadores e operários de construções, na beira do mar, nas ruas e nos terreiros. Isso fez com que fossem associadas às camadas populares e caracterizadas como uma expressão genuína do povo.

A partir da década de 1970, enquanto dança de roda de adultos, a ciranda conquistou grandes cidades, como Recife e Olinda. E começou a se tornar um produto turístico: foram criados, por exemplo, festivais de ciranda.

Na mesma época, a ciranda começou a ser apropriada de diferentes formas, em regiões distintas.

De acordo com o escritor e teatrólogo Altimar Pimentel, antes mesmo do surgimento da dança em Pernambuco, o termo “ciranda” já era usado no litoral fluminense, no interior paulistano e no Amazonas.

Conforme se expandiu pelo país, a ciranda foi associada às crianças.

O que é ciranda?

“Dança de conjunto com formação em círculo que ocorre em Pernambuco e na Paraíba. A coreografia é bastante simples: no compasso da música, dão-se quatro passos para a direita, começando-se com o pé esquerdo, na batida forte do bombo, balançando os ombros de leve no sentido da direção da roda. Pode-se destacar três passos mais conhecidos: a onda, o sacudidinho e o machucadinho.

Os participantes são denominados cirandeiros, havendo também figuras de mestre (responsável por tirar as canções), contramestre e músicos, que ficam no centro da roda.

A zabumba, o mineiro ou ganzá, maracá, caracaxá (espécie de chocalho), a caixa ou tarol formam o instrumental mais comum de uma ciranda, podendo também ser utilizados a cuíca, o pandeiro, a sanfona ou algum instrumento de sopro.”

Fonte: Tesauro de Folclore e Cultura Popular Brasileira - Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional/MinC.

Quem é Lia de Itamaracá, a rainha da ciranda

Uma das cirandeiras mais conhecidas do país, Maria Madalena Correia do Nascimento nasceu em 12 de janeiro de 1944, na Ilha de Itamaracá, em Pernambuco.
Cantava ciranda desde os 12 anos e, aos 19, já se apresentava em teatros e praças.

Foi cozinheira de um restaurante na ilha e merendeira de uma escola estadual, profissão que seguiu exercendo em paralelo à carreira artística.

Lia de Itamaracá: dançarina, compositora e cantora de ciranda (Foto: Janine Moraes, Ministério da Cultura/ Wikimedia commons)

A canção “Essa ciranda quem me deu foi Lia...” ajudou Lia de Itamaracá a ser reconhecida e, então, nomeada a Rainha da Ciranda pelos jornais de Recife.

A autoria da composição é contestada. Uma versão diz que a canção foi composta por Lia e gravada por Teca Calazans; a outra afirma que a canção seria de autoria do mestre cirandeiro Antônio Baracho.

Com o álbum Eu sou Lia, lançado no ano de 2000, a cirandeira abriu caminho para o reconhecimento internacional, nos Estados Unidos e na Europa.

Em 2005, Lia de Itamaracá recebeu o título de Patrimônio Vivo de Pernambuco.

“A ciranda é uma confraternização. Todo mundo dá-se as mãos, na maior harmonia, na maior satisfação, na maior alegria. A ciranda não tem preconceito. Dança branco, preto, criança, velhos. Não tem preconceito. Caiu na roda, dança. A ciranda é uma força muito grande, eu me sinto muito feliz cantando”, disse Lia, em entrevista ao jornal Brasil de Fato.

Ciranda, diversidade cultural e manifestações sociais brasileiras

A ciranda faz parte da cultura de muitos povos dentro do Brasil e é uma forma de expressar laços nas comunidades.

“A roda tem um significado muito grande, é um valor civilizatório afro-brasileiro, pois aponta para o movimento, a circularidade, a renovação, o processo, a coletividade: roda de samba, de capoeira, as histórias ao redor da fogueira”, defende a educadora Azoilda Loretto da Trindade, em Valores Civilizatórios afro-brasileiros na Educação Infantil.

Povos indígenas brasileiros, por exemplo, possuem inúmeras práticas culturais nesse sentido. Um exemplo é o Toré, ritual que envolve uma dança circular, acompanhada por cantos, e que foi incorporado atualmente ao movimento indígena da região Nordeste como uma forma de expressão étnica e política.

Cirandas, saraus e outras manifestações artísticas e culturais também são comumente vistas em atos políticos, sobretudo, de esquerda.

“As pessoas cantam juntas, dançam juntas, elas se dão as mãos, reconhecem a si mesmas umas nas outras. Então, a ciranda é arte, é cultura, é lúdica e, dependendo do contexto, a ciranda pode trazer uma mensagem política de unidade, de resistência, de solidariedade”, explica Sabrina Fernandes, doutora em Sociologia, em vídeo publicado no canal Tese Onze, no YouTube.

No contexto político, essas manifestações, entretanto, são bastante criticadas por serem consideradas supostamente vazias e ineficientes – o que levou ao uso pejorativo da expressão “cirandeiro (a)”.

“A gente tem que tomar muito cuidado com o preconceito enrustido em negativizar o termo ‘cirandeira’ e expressões artísticas, como se elas não tivessem um papel bem importante a cumprir na politização, na mobilização, no aspecto de atrair pessoas pra luta, de educar, de criar momentos de solidariedade e de cuidado”, alerta Sabrina Fernandes, no mesmo vídeo.

A ciranda na Educação

O universo da ciranda é vasto e pode ser explorado de diferentes formas e em diferentes segmentos, inclusive na Educação Jovens e Adultos (EJA).

O trabalho mais comum, no entanto, acaba se dando com crianças menores.

Obra do artista plástico carioca Ivan Cruz, de série intitulada Brincadeiras de Criança (Imagem: Ivancruz.com.br)

A ciranda infantil é considerada uma brincadeira de roda, na qual, em geral, os pequenos ficam de mãos dadas em círculo.

As canções entoadas – muitas vezes, também, coreografadas – exploram o universo imaginário infantil por meio de letras simples, com rimas, repetições e trocadilhos.

Grande parte dessas músicas foi e é passada de geração em geração, integrando o cancioneiro popular brasileiro.

“[A ciranda infantil] Tem conteúdo socioafetivo e expressão simbólica por incluir tradição, música e movimento. Nela as crianças acrescentam coreografias ao ritmo de cantigas infantis e, quando utilizadas em contextos escolares, permitem o desenvolvimento físico, emocional e intelectual das crianças e dos jovens. É uma dança democrática que não estabelece hierarquias, pois não possibilita a existência de um solista. Qualquer um pode bailar com expressões corporais naturais e singelas”, explicam as pesquisadoras Maristela Loureiro e Sonia Lima, no artigo As Cirandas Brasileiras e sua inserção no ensino fundamental e nos cursos de formação de docentes.

Em tempos de distanciamento social devido à pandemia da Covid-19, a melhor forma de manter vivo o universo das cirandas infantis é recorrer a músicas, vídeos e animações disponíveis na internet.

A série Cantigas de Roda, por exemplo, produzida pela MultiRio, reúne histórias animadas embaladas pelas clássicas canções que ajudam a manter viva a tradição das brincadeiras infantis. Os nove vídeos estão reunidos em uma playlist no YouTube. Confira!

 

Fontes:
Secretaria Municipal de Cultura de Recife.
GASPAR, Lúcia. Toré. In: Pesquisa Escolar. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2011.
CALLENDER, Déborah. Histórias da ciranda : silêncios e possibilidades. Textos escolhidos de cultura e arte populares, Rio de Janeiro, 2013.
CALLENDER, Déborah. Quem deu a ciranda a Lia? Narrativas orais em torno dos sentidos de uma canção. X Encontro Nacional de História Oral - Testemunhos: História e política. UFPE, Recife, 2010.
SANTOS, Meigue Alves dos. Que som é esse? Reflexões sobre música, corpo e movimento na educação infantil. Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), 2019.
LOUREIRO, M; LIMA, S. As Cirandas Brasileiras e sua inserção no ensino fundamental e nos cursos de formação de docentes, Todas as Musas, 2013.
SILVA, S. V. da. Culturas do açúcar em Pernambuco. Clio - Série Revista de Pesquisa Histórica, 2008. Universidade Federal de Pernambuco.
VICENTE, Tamisa Ramos. Vamos cirandar; políticas públicas de turismo e cultura popular: festivais de ciranda em Pernambuco 1960 – 1980. Universidade de Caxias do Sul, 2008.

 
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