Os portugueses adotaram várias estratégias para sobreviver e vencer no além-mar. Uma delas foi a formação de uma rede de autoproteção. Embora essa prática fizesse aumentar as rixas entre brasileiros e lusos, os comerciantes patrícios, já estabelecidos no Rio de Janeiro, davam preferência a empregar conterrâneos. Muitos imigrantes, na verdade, aportavam no Rio com alguma referência de parente ou amigo já instalado na cidade.
Outra estratégia adotada foi a criação de associações de beneficência e auxílio mútuo. O principal objetivo era a prestação de socorro aos conterrâneos em casos de doença e outras dificuldades. Mas, como a maioria dos imigrantes lusos era formada por homens jovens que aportavam na cidade, sem família, milhares deles se casaram com brasileiras, impondo a abertura dos serviços das associações para seus filhos e familiares nascidos no Brasil. As associações portuguesas acabaram, assim, exercendo papel importante para a sociedade carioca.
A mais antiga, no Rio de Janeiro, foi fundada em 1840: a Real e Benemérita Sociedade Portuguesa de Beneficência, mais conhecida como Beneficência Portuguesa, que, nove anos após sua fundação, durante uma epidemia de febre amarela, criou uma enfermaria para atendimento aos portugueses. Pouco tempo depois, em 1858, a sociedade inaugurou o seu primeiro hospital, o São João de Deus, que acabou se transformando em instituição de referência na área de saúde da cidade.
Alta cultura lusa
Outras instituições de auxílio mútuo, como a Real e Benemérita Caixa de Socorros D. Pedro V, foram fundadas pelos portugueses, mas elas estão longe de ser a única forma de associativismo dos lusos no Rio de Janeiro. Antes mesmo da fundação da Beneficência Portuguesa, um grupo de 43 imigrantes havia criado, em 1837, o Gabinete Português de Leitura, inspirado nas diversas boutiques à lire que pipocaram na Europa a partir da onda de ilustração, que surgiu com a Revolução Francesa.
Em 1880, por ocasião do tricentenário de morte de Luís de Camões, os portugueses mais bem estabelecidos na cidade – entre eles, José Vasco Ramalho Ortigão, o mandachuva do magazine Parc Royal, e o visconde de Moraes, fundador do Banco Português do Brasil – decidiram dar início à construção de uma nova sede. O novo e suntuoso prédio, construído com traços góticos renascentistas para evocar os tempos do rei d. Manuel e a epopeia do descobrimento, foi inaugurado em 1887 e se constitui, até hoje, em uma das joias arquitetônicas da cidade. Em 1900, o Gabinete virou biblioteca pública e, em 1906, quando aconteceu uma grande exposição do artista plástico português José Malhoa em suas dependências, o rei d. Carlos V atribuiu-lhe o título de “Real”. Hoje, o Real Gabinete Português de Leitura é uma das principais bibliotecas da cidade, com um acervo de cerca de 350 mil volumes, incluindo obras raras do século XVI.
Banco Português
Desde meados do século XIX, vários imigrantes portugueses estiveram envolvidos com a criação de casas e cooperativas bancárias que viessem facilitar os negócios e a intermediação de remessas da comunidade lusa estabelecida na cidade. Com a intensificação da emigração, no início do século XX, instalaram-se alguns bancos lusitanos, no Rio. A fim de disputar esse mercado e facilitar seus próprios negócios, alguns imigrantes portugueses, bem-sucedidos e estabelecidos no Rio de Janeiro, se reuniram e fundaram, em 1918, o Banco Português do Brasil.
A família Sotto Maior era a maior acionista do banco. Mas seu presidente (que acabou virando vitalício) era o visconde de Moraes, que, além de vasto patrimônio, gozava de grande reputação política na cidade, inclusive entre os imigrantes portugueses, por estar sempre envolvido em ações de amparo aos lusos mais pobres. A figura do visconde contribuiu com o estabelecimento da grande confiança que a expressiva comunidade portuguesa depositou no banco, o que ajudou, de maneira decisiva, a que a instituição passasse incólume pela grande depressão econômica de 1930. O Banco Português do Brasil existiu até 1973, quando foi incorporado pelo Banco Itaú, da família Setúbal, também de origem portuguesa.
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