Em 1º de setembro, comemora-se o aniversário de nascimento da pintora Tarsila do Amaral (1886-1973), considerada uma das principais representantes do modernismo no Brasil. E por que não aproveitar a oportunidade e levar a artista para a sala de aula?
Em 2013, Érica Campos, pedagoga e professora do EDI Renan de Souza Leal (9ª CRE), em Campo Grande, desenvolveu, com sua turma de maternal II, o projeto Fazendo Arte com Tarsila. “Ela sempre foi um ícone para mim. Uma artista que representa de fato o Brasil. Suas obras me fascinam e sua história é uma referência feminista”, opina a professora.
“Vejo na obra da Tarsila do Amaral uma gama de possibilidades para serem desenvolvidas na Educação Infantil. Temas brasileiros, em cores vivas e formas simples, o que me remete diretamente a pensamentos ‘de infâncias’”, comenta Érica, ressaltando que atividades de releitura das obras, usando pintura, recorte e colagem, desenho e reciclagem, entre outros, são sempre bem-vindos em trabalhos com a criançada.
O projeto desenrolou-se por todo o ano letivo. Érica pesquisou, pensou sobre os conteúdos e montou um esquema de possibilidades de abordagem. “Separei as obras por bimestre e as usei como ponto de partida para a introdução de conteúdos.”
A professora relembra que, na época, a mãe de um de seus alunos a procurou para relatar um fato curioso. “Ela disse que estava assistindo TV com o filho e passou um comercial que falava sobre Tarsila do Amaral. O menino insistiu para que a mãe olhasse e, quando viu uma foto da artista, logo disse: ‘Mãe, aquela é a Tarsila do Amaral! Lá na escola, a tia Érica fez um montão de desenhos dela pra gente pintar!’", conta a professora, que, na ocasião, se emocionou com as palavras de gratidão da mãe de seu aluno.
Manuela Maria da Silva dos Santos, uma das alunas de Érica em 2013, lembra até hoje da releitura que fez da obra A Negra. “O quadro é muito significante. Muitos negros já sofreram preconceitos, e os brancos não aceitam nossa cor negra. Algumas pessoas não gostam de negros. Então, eu adorei o retrato que fiz com a tia Érica. Adoro esse retrato até hoje!”, comentou a ex-aluna, hoje com 7 anos.
“A arte tem papel fundamental na educação, uma vez que dialoga com qualquer tipo de conteúdo e abrange todas as culturas em sua diversidade. Sempre será a melhor ponte para chegar a um objetivo, dentro ou fora da escola. É por meio de suas mais variadas manifestações que podemos influenciar e ser influenciados, agir e reagir no mundo. Ela nos afeta de maneira genuína, possibilitando a transformação por meio da ação e da reflexão, o que é imprescindível na construção do conhecimento. A arte deveria ter um lugar privilegiado dentro da escola. Não há idade certa para apreciá-la”, acredita Érica.
Confira, a seguir, temas que podem ser desenvolvidos a partir de algumas obras de Tarsila do Amaral, segundo a professora. O material também foi publicado no blog da docente.
1) Autorretrato
Foto: tarsiladoamaral.com.br
É possível trabalhar a identidade da criança. Pode-se iniciar fazendo uma apresentação da artista, contando sua história e, depois de apresentar o autorretrato, mostrar imagens da Tarsila, explicando que ela fez sua própria pintura, que aquela imagem reflete como ela se via.
A partir de então, podem-se usar diversas técnicas para abordar conteúdos como: o “eu” (quem sou? como sou? como me veem?); aspectos físicos da criança; diferenças (mostrando que cada um tem suas características e maneiras de ser); autoestima.
2) A Família
Foto: tarsiladoamaral.com.br
Espécie de continuidade do trabalho feito com o Autorretrato. Se antes a fala foi sobre identidade, agora a proposta pode ser ajudar a criança a conhecer a própria história e a história de sua família, sentindo-se participante dela. Falar sobre a família (quem faz parte? como ela é? as diferentes famílias) e a árvore genealógica.
3) A Lua e Sol Poente
Fotos: Reproduções Romulo Fialdini (esq.) e Eduardo Castanho/Itaú Cultural (dir.)
Usar as duas obras ao mesmo tempo e fazer um comparativo, explorando as diferenças entre o dia e a noite: opostos (claro/escuro); características do céu de dia e à noite (cores, Sol, Lua, estrelas, nuvens); rotina em determinado período do dia (dormir/acordar, almoçar/jantar, desjejum/lanche).
4) O Vendedor de Frutas
Foto: tarsiladoamaral.com.br
Permite falar de: frutas (como partes da planta e suas diferenças – tamanho, sabor, cor, textura, forma, tipos de semente); profissões (o que faz um vendedor de frutas? como ele trabalha? onde ele trabalha?); a feira (você conhece? como é uma feira? o que se vende lá? vamos brincar de feira?) e meios de transporte (barco – como e onde trafega).
5) Manacá
Foto: tarsiladoamaral.com.br
Simples para se trabalhar com as flores (em partes da planta, em suas diferenças – tamanho, cheiros, cores, texturas, formas, tipos de pétala) e os sentidos (visão e olfato).
6) Floresta
Foto: tarsiladoamaral.com.br
Ótima para abordar questões envolvendo o meio ambiente e partes da planta (tronco, folhas e frutos), as diferentes árvores frutíferas e conceitos de matemática (tamanho, espessura, quantidade).
7) Operários
Foto: tarsiladoamaral.com.br
Partes do corpo (cabeça, boca, nariz, olhos, orelha) e as diferenças físicas entre as pessoas (cor da pele, formato do rosto e dos lábios, formato e cor dos olhos, tipo e cor do cabelo); o trabalho (contextualizando a obra, falar sobre a importância do trabalho, para que serve, e os trabalhadores das indústrias).
8) O Touro
Foto: obviousmag.org
De forma simples e objetiva, abordar os animais (mamíferos, domésticos etc.) e suas características, além de questões relacionadas a quantidade, como par/ímpar (patas, chifre, rabo).
9) Cuca
Foto: tarsiladoamaral.com.br
Para apresentar o folclore (a lenda da Cuca), a literatura infantil (livro Sítio do Picapau Amarelo, de Monteiro Lobato), o medo (da Cuca e os medos que crianças possam ter – do que você tem medo? por quê?) e a fantasia (usar fantoches, encenações, música e vídeo; por exemplo, A Cuca Te Pega, na versão da Cássia Eller).
10) Abaporu e Urutu
Pode-se trabalhar a obra de forma subjetiva, deixando a criança livre para interpretar a imagem, direcionando-a apenas com questionamentos:
Foto: tarsiladoamaral.com.br
- Abaporu: o que estão vendo? O que esta pessoa está fazendo? O que está pensando? O que está sentindo?
De maneira mais objetiva, pode-se falar, por exemplo, sobre partes do corpo (já que algumas se destacam na imagem) e tamanhos (pé e mãos grandes e cabeça pequena);
Foto: tarsiladoamaral.com.br
- Urutu: o que vocês estão vendo? O que tem dentro desse ovo? Será que ele está em um ninho? De quem será esse ovo?
É possível, também, abordar a própria cobra urutu.
* Tarsila do Amaral faleceu em 1973, em São Paulo. Suas obras podem ser vistas neste catálogo e no site tarsiladoamaral.com.br.
Fontes:
Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras
http://obviousmag.org/
http://tarsiladoamaral.com.br