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Como trabalhar com cartas e cartões postais no Ensino Fundamental I
14 Fevereiro 2020 | Por Fernanda Fernandes
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Aluna da E.M. Roberto Coelho participando do projeto (Foto: Arquivo pessoal da professora Danielle Viana)

Elas se conheceram por meio de grupos de trocas pedagógicas no Facebook e no WhatsApp e desenvolveram um projeto que resgata a comunicação por cartas. Fabiana Pinto Gomes Lima (RJ), Charleny Aparecida de Moura Fernandes (MG),  Janaína Flores (RS), Paula Fernanda Corrêa do Prado (SP) e Susana Alves da Silva (DF) vivem em estados diferentes, não se conhecem pessoalmente, mas, com a ajuda do Google Drive, criaram o Viajando pelo Brasil através de cartas, em 2018, com a intenção de propor uma nova alternativa para estimular a leitura e a escrita dos alunos.

O projeto consiste no intercâmbio de cartas entre estudantes do 4º e do 5º ano de escolas públicas do Brasil. “Os alunos escrevem para crianças da mesma faixa etária, apresentando a história deles e da região onde vivem. Queríamos que nossos alunos compreendessem melhor o conceito de regionalidade, conhecessem as características do país e enxergassem a riqueza da diversidade  cultural do nosso povo”, explica Fabiana Lima, a representante carioca entre as autoras e que atualmente é professora regente na E.M. Aspirante Carlos Alfredo (5ª CRE), em Turiaçu.

“Para os alunos é importante esse protagonismo, o diálogo e o cuidado no momento de escrever  para alguém desconhecido, mas que aguarda ansioso pela carta. Essas trocas são inspiradoras, eles percebem que o conteúdo é real, que vai além do que está no material didático – e que muitas vezes parece abstrato para eles”, complementa.

No Rio, o projeto foi desenvolvido nas escolas municipais Paraguai (5ª CRE), Roberto Coelho (10ª CRE) e no Ciep Antonio Candeia Filho (6ª CRE). Isso porque, apesar de Fabiana atuar, na época, no município de Nova Iguaçu, ela apresentou a proposta para colegas que lecionavam no Rio de Janeiro, que aceitaram o desafio.

Conteúdos de Língua Portuguesa puderam ser aprimorados por meio do projeto (Foto: Arquivo pessoal da professora Danielle Viana)

Segundo Fabiana, o trabalho com cartas causou um misto de surpresa e curiosidade nos alunos. “Eles vivem em um mundo rodeado de recursos digitais variados, então arregalaram os olhos ao saber que seus professores, por exemplo, pertenceram à geração das cartas. Mas, segundo relatos das professoras, eles ficavam muito ansiosos para receber e ler as correspondências”, destaca a idealizadora, ressaltando que o trabalho com cartas levou a uma reflexão sobre a escrita, da estrutura textual ao amadurecimento das ideias.

Em 2019, o projeto recebeu o prêmio Paulo Freire, concedido pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), na categoria experiência pedagógica no Ensino Fundamental.

Como trabalhar com cartas no Ensino Fundamental I

Neste ano, o projeto entra na terceira edição. “Como todo projeto, sofreu alguns ajustes, considerando sugestões das professoras participantes de cada região. Ou seja, cada escola adaptou o projeto à sua maneira, mas o centro de tudo foi o protagonismo do aluno”, observa Fabiana.

A ideia inicial era de que os alunos escrevessem, coletivamente, uma carta apresentando a escola e a região onde vivem, seguindo todo um roteiro elaborado pelas professoras. Em uma segunda etapa, em dupla ou individualmente, escreveriam sobre eles mesmos, suas famílias, o local onde moram, o que gostam de fazer etc.  

“Foram exploradas questões regionais referentes ao vocabulário próprio da cidade,  às influências das culturas indígena, africana e europeia na construção do povo brasileiro, ao folclore e à culinária  local”, exemplifica a idealizadora do projeto no Rio.

Estudantes da E.M. Roberto Coelho ficaram ansiosos e eufóricos para receber e ler as correspondências (Foto: Arquivo pessoal da professora Danielle Viana)

Então, as professoras responsáveis por cada turma reuniam as cartas e ficavam responsáveis por contatar as docentes de outros estados e fazer o envio pelos Correios. Algumas turmas tiveram, inclusive, a oportunidade de visitar uma agência dos Correios e conhecer o processo de postagem e selagem das cartas.

Em 2019, algumas regentes apostaram no uso da tecnologia: usando um smartphone, auxiliaram os alunos a gravarem videocartas. “As crianças se identificam muito com a linguagem de vídeos. A grande sacada nesta proposta foi fazer uma carta filmada, de forma didática, com roteiro direcionado, produzido pela professora regente e por seus alunos. Assim, uma criança lia o conteúdo da carta, enquanto eram exibidas imagens da escola, dos estudantes, de pontos turísticos da região etc.”, explica Fabiana.

De acordo com ela, o principal desafio foi conciliar o calendário das escolas participantes e, também, lidar com imprevistos, como a greve dos Correios, que alterou as datas das postagens.

Na E.M. Roberto Coelho (10ª CRE), em Santa Cruz, a professora Danielle Viana Ferreira da Silva conseguiu aliar o trabalho com cartas ao projeto pedagógico da escola – O melhor de mim a cada dia - Cuidando das emoções – e à produção textual.

“Minha motivação nasceu do desejo de mostrar aos meus alunos um meio de comunicação que não é mais divulgado e nem tão usado pela população, mas cheio de expectativa e com um significado emotivo especial. O projeto da troca de cartas pôde envolver os alunos significativamente”, conta a professora, que soube do projeto por meio de uma divulgação em uma página do Facebook, que buscava professoras do 4° e 5° ano, de todo o Brasil, interessadas em participar do intercâmbio.

O trabalho com cartões postais pôde ser feito com alunos de diferentes anos de escolaridade (Foto: Arquivo pessoal da professora Fabiana Lima)

“O trabalho principal com a turma, e que me trouxe excelentes resultados, foi na parte da estrutura da elaboração de uma carta, na ortografia, na coesão e na coerência em cada parágrafo. Vi melhoras significativas em uma turma que já tinha um bom conceito. O vocabulário modificou-se e os textos passaram a ser bem mais elaborados e com autonomia. Isso tudo além da parte relacionada à Geografia, que veio naturalmente com os relatos dos colegas das outras regiões, e que deixaram os alunos surpresos”, descreve Danielle.

Na E.M. Paraguai (5ª CRE), em Marechal Hermes, o trabalho comandado pela professora Roberta Batista Pereira foi direcionado aos conteúdos de Geografia. “Meu foco não foi tanto a escrita e a alfabetização, e sim o ensino sobre estados, municípios, capitais do Brasil. Para os alunos, foi muito significativo o fato de escrever para alguém que não fosse a professora. Nas cartas, eles falavam sobre a vida deles, onde moravam, como era a escola e também perguntavam sobre a vida dos colegas de outros estados. Alguns quiseram mandar fotos da famosa batata frita de Marechal Hermes, outros mandaram suas próprias fotos e até poesias. Eles aprenderam muita coisa sobre cada localidade. Uma das trocas foi feita com uma escola rural do Tocantins e as crianças ficaram impressionadas com as diferenças regionais”, relata a professora.

“O maior ganho foi o de conhecerem o país. Eles gravaram os estados e as capitais de um dia pro outro, ficaram muito empolgados e até paravam para ver a previsão do tempo para saber mais sobre os outros estados”, relembra Roberta.

Letramento e Arte: releituras de grandes pintores viram cartões postais

Com o sucesso do Viajando pelo Brasil através de cartas, a professora Fabiana Lima quis buscar uma proposta de trabalho que seguisse a mesma linha de intercâmbio entre alunos, mas contemplasse, também, outros anos de escolaridade. Assim, a partir de uma ideia da professora Paula Prado, da cidade de Mogi das Cruzes (SP), um grupo de docentes – Janaína Flores (RS), Luciana Silva e Iara Silva (ambas de MG), além de Paula e Fabiana – criou o Letramento e Arte – Grandes obras pelo olhar de pequenos artistas: releituras em cartões postais.

O pintor espanhol Joan Miró foi um dos artistas selecionados no projeto Letramento e Arte (Foto: Arquivo pessoal da professora Fabiana Lima)

No projeto, alunos do 1º ao 4º ano conheceram a vida e a obra de grandes pintores e confeccionaram cartões postais inspirados em obras dos respectivos artistas, para serem enviados a outras turmas. Na produção dos postais, os professores utilizaram diferentes técnicas, como pontilhismo, mosaicos e recorte e colagem. Junto com o primeiro cartão, era enviada uma carta de  apresentação feita coletivamente pela turma, falando, brevemente, sobre o grupo de alunos, o local onde estudam e a biografia do artista representado.  Depois, um segundo cartão postal era enviado com uma carta de agradecimento e despedida.

No Rio, Fabiana desenvolveu o trabalho com uma turma do 2º ano na E.M. Aspirante Carlos Alfredo (5ª CRE), com a supervisão técnica de Tassia Nunes, professora de Artes Visuais da SME-Rio. O artista selecionado foi o espanhol Joan Miró.

Nas outras escolas participantes, dos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais (duas unidades), os pintores foram Candido Portinari, Romero Brito, Tarsila do Amaral e Di Cavalcanti, respectivamente.

“Queríamos fazer algo lúdico, trabalhar a alfabetização e possibilitar a troca de experiências, sensibilizando os alunos quanto a formas de texto não verbais. Foi mágico ver meus alunos relatando suas vivências e com um olhar mais aguçado e sensível aos detalhes. Foi ótima a parceria com a professora de Artes e tivemos um retorno muito positivo dos pais e responsáveis”.

 
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