Quem vê o mar tranquilo da entrada da Baía de Guanabara hoje em dia, nem imagina que naquele espaço aconteceram batalhas sangrentas. A região foi disputada, durante anos, pelos governos da França e de Portugal, devido à posição estratégica que a área tinha – era possível posicionar navios e avistar a chegada dos inimigos. A calmaria só iria se estabelecer ali dois anos depois que o militar Estácio de Sá fundasse a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1°de março de 1565, entre os morros Cara de Cão e Pão de Açúcar.
Família ilustre
De acordo com os poucos registros que se tem, os historiadores acreditam que Estácio de Sá nasceu em Coimbra, em 1520. Pertencente a uma família nobre de Portugal, era filho do fidalgo Diogo de Sá, primo de segundo grau de Mem de Sá, governador-geral do Brasil. Devido a esse parentesco, Estácio era considerado por muitos como “sobrinho” de Mem de Sá. É difícil encontrar anotações dos primeiros anos de vida de Estácio. Seu período mais glorioso foi na fase adulta, quando ajudou a corte portuguesa a conquistar territórios inexplorados.
Protagonismo de Estácio
Os primeiros confrontos na Baía de Guanabara surgiram depois que os franceses se fixaram ali, em 1555. Eles se instalaram nas ilhas de Serigipe (hoje Villegagnon), Paranapuã (atual Ilha do Governador), Laje (onde fica hoje o Forte Tamandaré da Laje, ocupado pelo Exército) e em Uruçumirim (Praia do Flamengo). Toda essa região invadida ficou conhecida como França Antártica.
Para reafirmar seu poder sobre o território brasileiro, Portugal mandou que Mem de Sá viajasse ao Brasil, com o intuito de impedir o avanço da França sobre as terras ainda não colonizadas pela coroa portuguesa. Em 1557, Estácio desembarcou pela primeira vez no país, para ajudar seu “tio” na missão. A tentativa inicial de dominar a baía não deu certo. Apesar de conquistar o Forte Coligny, na Ilha de Serigipe, com o apoio de colonos e jesuítas da Vila de São Vicente, em 1560, Estácio e Mem de Sá enfrentaram dificuldades para permanecer na região por causa de problemas nas embarcações.
Com o recuo obrigatório, os franceses ocuparam novamente o forte com o apoio dos índios tamoios que ali viviam. Estrategicamente, após a derrota, Estácio voltou à sua terra natal na tentativa de conseguir mais ajuda para a batalha.
Em 1563, D. Catarina, regente do trono português, ordenou que Estácio de Sá voltasse ao Brasil como chefe da esquadra destinada a dominar a região. O militar chegou à baía em fevereiro de 1564 e, percebendo que os índios estavam mais fortes, devido à aliança com os franceses, partiu para São Vicente em busca de reforço. Lá, recebeu apoio dos padres jesuítas Manuel de Nóbrega e José de Anchieta, que recrutaram habitantes locais, inclusive índios, para se juntar a Estácio de Sá. No dia 20 de janeiro de 1565, todos partiram para a baía e receberam auxílio de indígenas vindos do Espírito Santo. Após algumas semanas de batalha, os franceses foram expulsos da antiga França Antártica.
Fundação e a vida na cidade
Após anos de guerras, Estácio fundou a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1° de março de 1565, aos pés do morro do Pão de Açúcar. O nome original da cidade era uma homenagem ao jovem rei de Portugal, D. Sebastião.
Entre março de 1565 e janeiro de 1567, Estácio participou ativamente da vida na cidade. Nesse primeiro momento de colonização, era o capitão-mor, responsável por nomear juízes, prefeitos e conceder sesmarias - distribuição de terras destinadas à produção agrícola para povoar o local.
Segundo relatos, ele lutou bravamente para reafirmar o poder lusitano no Rio de Janeiro, resistindo a diversas investidas de franceses e indígenas, ao longo do tempo em que esteve no comando. Nos registros históricos, não se fala sobre a vida particular do militar português, se teve filhos ou família.
Contra-ataque
Apesar de expulsos da cidade, os franceses não desistiram de conquistar o local onde foi fundado o Rio. Os dois anos seguintes à conquista dos lusitanos foram de intensas investidas por parte dos inimigos. Para ajudar o capitão-mor a manter o poder sobre a região da antiga França Antártica, em 20 de janeiro de 1567 chegou ao Rio uma esquadra vinda do Nordeste, comandada por Cristóvão de Barros. O reforço foi fundamental para a vitória nas batalhas do Uruçumirim e da Ilha Paranapuã, que estavam acontecendo naquele período.
No mesmo dia da chegada de Cristóvão, Estácio foi atingido, no rosto, por uma flecha envenenada, na batalha de Uruçumirim, vindo a falecer em 20 de fevereiro, um mês depois, devido às complicações do ferimento. Seus restos mortais estão hoje em um túmulo, na Igreja dos Capuchinhos, na Tijuca.
Reconhecimento
Quando o Rio de Janeiro completou 400 anos de fundação, em 1965, não havia nenhuma estátua que homenageasse o fundador da cidade. Mas esse cenário mudou quando os compositores Raul Mascarenhas e Haroldo Barbosa fizeram um samba provocativo sobre o assunto.
“Procurei em toda a cidade/ por seu fundador/ onde estará?/ Cadê a estátua de Estácio de Sá? Cadê a estátua de Estácio de Sá?”
O samba, que ficou conhecido na voz do cantor Miltinho, inspirou a construção de um monumento para homenagear Estácio. Por serem raras as imagens que o retratassem, o arquiteto Lúcio Costa projetou no Aterro do Flamengo, em 1973, uma pirâmide em forma de triângulo, que exibe um obelisco de 17 metros de altura. Um dos vértices da pirâmide aponta para o local da fundação da cidade. Ao todo, o espaço tem 450m² e, em 2010, foi aberto um centro de visitação no subsolo, onde se encontram uma réplica da lápide de Estácio e um mapa do Rio, datado de 1574.
Na cidade que ajudou a construir, o militar português também recebeu outros reconhecimentos. Criado em 1865, o bairro do Estácio, na Zona Central, é um deles. Conhecido por, no passado, ser um lugar de moradia das classes média e média baixa, tem hoje uma rua, um largo e uma tradicional escola de samba com o nome do fundador do Rio. Na Urca, o corajoso português é homenageado dando seu nome à tradicional E.M. Estácio de Sá.
Fontes: Dicionário do Brasil Colonial, de Ronaldo Vainfas. Sites: Oi Educa, E-Biografias, Veja Rio, Parque do Flamengo, UOL Educação e Jornal da PUC.
* Beatriz Calado, estagiária, com supervisão de Regina Protásio.
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