A partir do momento em que a transferência da capital federal do Rio de Janeiro para Brasília tornou-se um fato irreversível, algumas perguntas se apresentavam insistentemente em debates acalorados que aconteciam, em especial, nos meios políticos e na imprensa. O que seria melhor para a cidade? Ser incorporada ao estado do Rio de Janeiro como capital, deslocando Niterói, ou apenas como um município fluminense? Constituir um novo estado emancipado? Transformar-se no Território da Guanabara?
Um ângulo dessa questão pode ser observado nas palavras do poeta Vinicius de Moraes (1913-1980), contemporâneo desse fato histórico: “Um repórter me telefona (...) para saber se eu achava melhor que o Distrito Federal fosse incorporado ao estado do Rio, (...) ou se preferia sua transformação no novo estado da Guanabara. Sem hesitação optei pela segunda alternativa, não só porque me parece que o Distrito Federal constitui uma unidade muito peculiar dentro da federação, como porque vai ser muito difícil a um carioca dizer que é fluminense (...). O negócio é mesmo chamar o Distrito Federal de estado da Guanabara, que não é um mau nome, e dar-lhe, como capital, o Rio de Janeiro, continuando os seus filhos a se chamarem cariocas”.
Em meio às disputas políticas, à sombra da campanha presidencial de 1960, a proposta do governo federal para constituir o Rio de Janeiro como Território da Guanabara, pelo prazo de dez anos, sob o controle e às expensas da União, era percebida como a manutenção do direito da intervenção federal na ex-capital, causando descontentamento aos políticos cariocas. Por outro lado, igualar-se à situação de outros territórios brasileiros como, por exemplo, o Acre, era impensável. Afinal, em qualquer decisão que fosse tomada sobre o futuro da cidade, pesaria o seu passado como cabeça do país – fator relevante quando foram analisadas as propostas que discutiam a criação do estado da Guanabara ou a fusão com o estado do Rio de Janeiro.
Quanto à possibilidade da fusão com o estado do Rio de Janeiro, a maioria dos políticos do antigo Distrito Federal, assim como a população de maneira geral, não aprovava tal solução. A razão central de todo esse descontentamento ligava-se ao fato de que a cidade do Rio de Janeiro, há mais de cem anos ostentando a condição de capital do Império e da República, fosse reduzida “a mera cidade ou capital de um estado que não é dos mais prósperos da União” e onde “três milhões de cariocas passariam a gravitar na órbita de dois milhões de fluminenses e a política municipal se somaria à provinciana”, conforme o editorial publicado no Jornal do Brasil em 17 de julho de 1958.
As propostas, nos meses iniciais de 1960, alcançaram o Congresso Nacional. A transferência da capital estava marcada para o dia 21 de abril e, portanto, exigia uma solução urgente. Parte significativa dessas preocupações, traduzidas em tantas questões, acontecia porque o Rio de Janeiro, no alvorecer republicano, fora transformado em capital vitrine, concentrando instituições culturais como o Museu de Belas Artes, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, a Academia Brasileira de Letras, a Biblioteca Nacional, o Museu Histórico Nacional e a Universidade do Brasil – todas de âmbito nacional.
A cidade era o centro divulgador de hábitos e de costumes. Lazer, por exemplo, significava ir aos museus, aos teatros, aos cinemas. Filmes, espetáculos e exposições compunham a cena carioca. O cineteatro Plaza (desativado em 1980), na Rua do Passeio, com 1.180 lugares, som de qualidade e efeitos luminosos na fachada, concorria com seus vizinhos mais próximos, como o Metro e o Palácio (na mesma rua), e outros localizados na Praça Floriano Peixoto. Jovens e adultos, com seus melhores trajes, ali procuravam “o divertimento e a cultura. (...) Era uma efervescência cultural na capital do Brasil”, segundo palavras do pesquisador Ricardo Maranhão.
O Rio era o principal centro financeiro do país, abrigando importante Bolsa de Valores, além de instituições bancárias e de previdência. Todo esse perfil, associado às belezas naturais, fazia a cidade ser o maior centro turístico do Brasil. Então, não estava em pauta apenas a nova identidade para a ex-capital federal. Tratava-se de encontrar, segundo a historiadora Marly Motta, uma “nova identidade para o país. (...) Como seria o Brasil sem a sua tradicional vitrine, sem o seu centro irradiador de civilização”?