A hesitação de D. João em cumprir as determinações de Napoleão fez com que se visse com o exército francês praticamente às suas costas. Sem saída, embarcou para o Brasil com a família real e a corte, cerca de dez mil pessoas da aristocracia e todo o Tesouro português. O embarque, realizado às pressas, como uma fuga, apenas um dia antes de as tropas napoleônicas ocuparem Lisboa, tirou a grandeza da ideia da transferência da corte.
Alguns historiadores, como Oliveira Lima, consideram que a vinda da corte para as terras americanas foi uma inteligente e feliz manobra política. Para ele, agindo assim, D. João "escapava de todas as humilhações sofridas por seus parentes castelhanos e mantinha-se na plenitude dos seus direitos, pretensões e esperanças. Era como que uma ameaça viva e constante à manutenção da integridade do sistema napoleônico". Entretanto, há aqueles que a veem como uma deserção covarde, não percebendo nela qualquer resquício de estratégia política.
O embarque de milhares de pessoas e seus pertences, em um dia bastante chuvoso, foi extremamente confuso, visto D. João ter se decidido em cima da hora. Todo um aparelho burocrático vinha para a colônia: ministros, conselheiros, juízes da Corte Suprema, funcionários do Tesouro, patentes do Exército e da Marinha e membros do alto clero. Baús com roupas, malas, sacos e engradados seguiam junto com as riquezas da corte. Obras de arte, objetos dos museus, a Biblioteca Real com mais de 60 mil livros, todo o dinheiro do Tesouro português e as joias da Coroa iam sendo colocados nos porões dos navios, bem como cavalos, bois, vacas, porcos e galinhas e mais toda a sorte de alimentos. Na manhã do dia 29 de novembro, a esquadra portuguesa finalmente partiu do Porto de Lisboa com destino ao Rio de Janeiro.
A população de Lisboa assistia atônita a toda essa movimentação. Não podia acreditar que estivesse sendo abandonada pelo príncipe regente e demais autoridades, levando tudo o que estivesse à mão, deixando-a totalmente desamparada para enfrentar o exército de Napoleão. Lisboa estava um caos. Junot e sua tropa, apesar de bastante desfalcada, não tiveram problema para dominar a cidade, cuja população estava atordoada com o que consideravam uma fuga vergonhosa.
Mais tarde, no Rio de Janeiro, na nova sede do Reino, essa situação seria assim traduzida em versos populares:
"É chegado a Portugal
O tempo de padecer,
Se te oprime a cruel França
Sorte melhor hás de ter."
"Quem oprime os portugueses,
Quem os rouba sem ter dó?
É esta tropa francesa
De quem é chefe Junot."
A viagem foi difícil. Com os navios superlotados, não havia espaço para todos se acomodarem. Muitos viajaram com a roupa do corpo, pois nem tudo pôde ser embarcado, já que a capacidade dos navios há muito havia sido superada. A água e os alimentos foram racionados. A higiene era de tal forma precária que houve um surto de piolho nos navios, obrigando as mulheres a rasparem a cabeça, entre as quais a princesa Carlota Joaquina e as demais damas da família real e da corte.
Para complicar a situação, quando a esquadra portuguesa estava próxima da Ilha da Madeira, uma forte tempestade a dividiu, sendo que metade das embarcações, inclusive a que levava o príncipe regente, foi parar no litoral da Bahia. Preocupado em evitar maiores problemas, D. João ordenou que todos parassem no porto mais próximo antes de seguir viagem para o Rio de Janeiro. A esquadra portuguesa com o príncipe regente aportou, assim, em Salvador, em 22 de janeiro de 1808, após 54 dias de viagem.