No tempo dos vice-reis, a vida do Rio de Janeiro acontecia nas ruas da cidade onde se localizavam as lojas dos mercadores, as oficinas, as chapelarias, as barbearias, as farmácias e os armazéns. Algumas afixavam tabuletas de madeira ou de ferro indicando os produtos que comercializavam. Eram, geralmente, espaços reduzidos, eventualmente com o chão coberto por esteirinhas ou tapetes. À beira do cais, o pregão popular ecoava ofertando a vaidade, como citado pelo historiador Pedro Calmon:
“Trago fazendas bem finas
P’rá moças do Brasil
Trago também ramalhetes
De flores de cor de anil”.
Pelas ruas estreitas, circulavam o banguê (estrado que poderia transportar pessoas ou coisas, em especial bagaço de cana), a liteira (cadeira portátil aberta ou fechada, particular ou de aluguel) e o seje (veículo de um só lugar com duas rodas). Neles, moradores dos arredores da cidade vinham para o Centro. Aqui e ali, os gritos do condutor afastavam os passantes: Eia! Uia! Oia! Eram vozes de escravos encarregados da condução do senhor, da sinhá ou da sinhazinha, chamados de andas (escolhidos entre os mais fortes e vistosos pelas casas abastadas a quem pertenciam). Sempre descalços, porém trajados com roupas de qualidade, usando perucas à moda francesa, casacos leves, saiotes sobre as calças curtas e luvas brancas. Citada pelo historiador Pedro Calmon, a sátira popular não perdoava: “Negro de luva? Sinal de chuva!”.
As sinhás e as sinhazinhas, quando nos derradeiros anos do século XVIII começam a deixar a reclusão da casa colonial, indo às igrejas, apenas saltavam dos seus transportes no interior dos templos, “levando consigo seus micos de estimação, os seus tapetes, as suas esteiras ou almofadas com que forravam (...) os lajedos, nela se acomodando”, segundo palavras do escritor Luiz Edmundo.
Os mais abastados, desejando ostentar, importavam a mais fina moda do comportamento europeu. Afinal, ser nobre traduzia-se em um estilo de vida que incluía situações como: não andar a pé, possuir criados escravizados ou forros (escravo liberto por carta de alforria), ter a posse de uma espada ou arma equivalente, e não misturar-se em lugares públicos com a massa da população. A alimentação era seguida de algumas regras e etiquetas: não se mastigar fazendo barulho nem mexer o queixo em demasia. Era de bom-tom limpar a boca antes de beber, não deixando vinho no copo. Mas a etiqueta não condenava o uso dos palitos, que poderiam ser utilizados à mesa.
Estabelecia-se, no tempo dos vice-reis, um grupo social, geralmente sem título, mas com recursos, disposto a provar (a todo custo) sua fidalguia completamente distinta daqueles tidos como da arraia-miúda.