Vista de cima, a cidade fotogênica também revela seus contrastes e, mesmo assim, depois de séculos, continua linda.
Versos famosos dizem que a alma canta quando surge o perfil sinuoso do Rio de Janeiro. Vista de cima, a cidade fotogênica também revela seus contrastes e, mesmo assim, depois de séculos, continua linda. Observar o local dessa forma tornou-se possível por conta das tecnologias desenvolvidas ao longo do tempo. Nada mais encantador, especialmente à noite, quando o firmamento fica pontilhado por estrelas que a cidade contempla e que iluminam o seu céu.
Para existir a possibilidade de apreciar o Rio dessa forma, a humanidade, coletivamente, deu passos transformadores, escrevendo capítulos importantíssimos na História. Passos que, no século XV, permitiriam que povos da Europa Ocidental, sob a liderança de Portugal, utilizando inúmeros conhecimentos acumulados, somados ao espírito aventureiro, enfrentassem as águas revoltas do Atlântico. Superando dificuldades – entre vontades e interesses –, incontáveis navegadores se lançariam pelo desconhecido em feitos nunca vistos. Utilizando instrumentos de medição como o compasso, o astrolábio e a bússola, além das cartas náuticas, alcançaram as terras do além-mar.
A caravela de descobrir, muito superior às outras daquele tempo, adaptada para enfrentar mares grossos, desempenharia também um importante protagonismo nas viagens. A embarcação, para o professor Antonio Vieira Martins, não era um navio de carga, no sentido tradicional da palavra: “A sua carga mais importante na volta era o conhecimento que realimentava as viagens seguintes”.
O fato histórico conhecido como Grandes Navegações, que permitiu o conhecimento da América portuguesa definida pelo tratado assinado em Tordesilhas, aconteceu porque o pensamento, à época, aliou ciência e técnica: olhar o céu e medir o chão. O conhecimento submetido à experimentação permitiu que obstáculos fossem superados e horizontes, desvendados – terras, coisas e pessoas. É nesse contexto, incluindo a procura de novos mercados e mercadorias, que, pela primeira vez, a Baía de Guanabara seria alcançada, no dia 1º de janeiro de 1502.
A cidade localizada nas cercanias da baía surgiria décadas depois, quando o calendário indicasse o primeiro dia do mês de março de 1565. No esforço para extinguir a França Antártica, centro das preocupações da Coroa lusitana, Estácio de Sá (1520-1567), sobrinho do governador-geral Mem de Sá (1500-1572), fundou um povoado, segundo suas palavras, “sob a invocação de São Sebastião, padroeiro do rei de Portugal, D. Sebastião”, no chão do seu entorno. Sua localização inicial, por estratégia militar, foi aos pés das muralhas naturais de granito, de onde era possível observar tanto a movimentação das embarcações pelo Atlântico como o interior da baía.
Diante das circunstâncias do conflito, fundar uma cidade que assegurasse o domínio efetivo da região representava um privilégio, concedido pelo rei de Portugal ao governador-geral. Erguida para ser uma fortificação no Atlântico Sul, diferente de uma simples vila da época, teria maior autonomia administrativa e judiciária. Singularidades como essa e outras estariam presentes no desenrolar de toda a história do Rio de Janeiro. “Cada coisa a seu tempo tem seu tempo” (Fernando Pessoa).