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D. Pedro II do Brasil, dois anos antes da derrubada do Império. Fotografia de 1887 (Crédito: Lucien Walery/Museu Imperial – Iphan)

As palavras citadas pela antropóloga Lilia Moritz Schwarcz configuram a situação material nos derradeiros tempos do governo pessoal de D. Pedro II (1825-1891): ”Comentava-se que o Paço da Cidade se transformara, com o tempo e a falta de uso, em um velho palácio decadente e abandonado, com seus móveis velhos e sem valor, já que o imperador só dormia lá durante a Semana Santa. (...) Mesmo o Paço da Boa Vista sofria de problemas, com cupins”.

Pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro, incontáveis vozes pregavam que o antigo brilho da família imperial já não era o mesmo. As carruagens em estado de abandono e o prédio do Palácio da Boa Vista, com apenas um encarregado de limpeza e dois serventes, eram um retrato da época. No carnaval de 1883, uma caricatura do imperador, sozinho em um quarto, apareceu em uma alegoria onde constava a frase: “Roubaram-lhe tudo”.

Segundo a escritora Lilia Moritz Schwarcz, “se até os anos 70 toda a vida cultural girava em torno da corte, a partir dos anos 80 novos grupos se formam, desvinculados do antigo brilho da família imperial”. Enquanto o fascínio se extinguia, as preocupações do imperador iam muito além dos cupins que faziam a festa, sem a menor cerimônia, devorando madeiras e tecidos. A fragilidade da monarquia se sobrepunha aos insetos, às moradias e às vestimentas.

Nuvens pairavam sobre o Império, apontando para tempestades que despencariam, envolvendo uma questão com bispos católicos e uma querela com os militares. Ambas desgastariam extremamente as relações da Coroa com a Igreja de Roma e com os militares. Muitos comentavam, aqui e ali, as atitudes aparentemente desinteressadas de D. Pedro II, mais idoso e adoentado. Entendiam que se comportava como um espectador, que assistia aos fatos que se desenrolavam no palco de um teatro político esgarçado, cada vez mais esvaziado.

Mas, apesar desses graves problemas, a principal questão que mobilizava o Império, principalmente a partir dos anos 1870, era o fim da escravidão. Abolir a escravidão era o que se ouvia pelas ruas, pelas praças da cidade do Rio de Janeiro e em outras regiões do país. Ora em forma de pergunta, ora em tom de dúvida ou em afirmação entusiasmada. E o que veio adiante, na chamada Lei Áurea, foi resumido em apenas dois artigos: “Art. 1º É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil. Art. 2º Revogam-se as disposições em contrário”.